LCM – 30 anos de história (1985-2015)

LCM – 30 ANOS DE HISTÓRIA

                                                                                                                                                                                                                   Edemar Roberto Andreatta

No início dos anos 80, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), já desenvolvia estudos sobre a reprodução artificial da tainha e realizava experimentos com engorda nos viveiros de terra na Estação do Itacurubi, com financiamento da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP).

Os importantes avanços obtidos na reprodução artificial, com água salgada, transportada em caminhão pipa não foram acompanhados pelos resultados na engorda das tainhas nos viveiros de terra. O crescimento era muito pequeno e não se via perspectiva de desenvolvimento da piscicultura pelo setor produtivo com aquela espécie.

Por outro lado os camarões, cujas formas jovens entravam pelo sistema de bombeamento com a água salobra, cresciam rapidamente e tinham alto valor. Foram então iniciados os experimentos com policultivo (tainha mais 4-5 camarões por m2) com juvenis capturados no baixio da Daniela e no Baixio do Aeroporto. Os resultados dos cultivos foram alentadores para o camarão.

Durante o processo de captura dos juvenis no ambiente natural, ficou muito claro que seria impossível desenvolver a indústria de cultivo buscando formas jovens na natureza.  A partir daí, foi idealizado o Laboratório de Camarões Marinhos (LCM).

Pela imensa dificuldade para a obtenção de recursos para a pesquisa na época e é possível que estejamos iniciando um ciclo de dificuldades parecido com aquele, o LCM foi idealizado para ter as finalidades de pesquisa, de ensino da graduação e de Pós-graduação, atuar no apoio a extensão para o desenvolvimento da indústria do cultivo e também que pudesse produzir algum bem que pudesse dar autonomia financeira para a sua longevidade. Assim, o Laboratório foi idealizado com escala para ser capaz de produzir as pós-larvas que o setor produtivo poderia necessitar no início da indústria.

No final de 1982, a construção do Laboratório na Barra da Lagoa e uma série de possíveis equipamentos a serem adquiridos, mais a folha salarial de 6 servidores UFSC, foram incluídas como itens do Plano Operativo no Programa EMBRATER-SUDEPE-BIRD.  O Plano foi aprovado e o Banco Mundial reembolsava 35 % do valor que a UFSC investia no projeto. Foi então dada à largada para a concepção do projeto e todas as providências para o início das obras que ocorreu em Novembro de 1983.

Neste mesmo período, logramos aprovação junto ao FIPEC (atual Fundação Banco do Brasil) um projeto de pesquisa e desenvolvimento do cultivo onde a maior parte dos itens aprovados estavam relacionados no Plano Operativo do Programa EMBRATER-SUDEPE-BIRD. Isso reforçou de sobremaneira o reembolso de recursos que nos permitiram construir o LCM do jeito que foi idealizado. Para ajudar ainda mais, no final do Programa, o percentual de reembolso passou a ser de 65 % e ainda nos foi concedido um adiantamento de 270 milhões de cruzeiros, o equivalente ao valor de 08 caminhonetes diesel cabine dupla.

Além do Professor Andreatta que coordenava o projeto, também participaram da idealização do LCM o estudante de agronomia Elpídio Beltrame (profissional cujo grau de dedicação é imensurável), o biólogo Israel Diniz Silva, o oceanógrafo Clóvis Matheus Pereira. Salienta-se que o Escritório Técnico Administrativo da UFSC (ETUSC), atual Departamento de Projetos de Engenharia e Arquitetura (DPAE), apoiou com projetos e cálculos estruturais. Também recebemos grande ajuda da Prefeitura Universitária (PU).

O início foi muito difícil, pois a obra, as aquisições e a administração de tudo era atribuição da equipe do LCM. Havia muito pouco recurso para a arrancada das obras e para ajudar fomos à Penitenciária Estadual solicitando 4 detentos que pudessem trabalhar conosco durante toda a construção. Passávamos na Penitenciária para pegar os detentos às 7h e os devolvíamos às 18h. Recebemos grande apoio do Restaurante Universitário (RU), mas o Prof. Elpídio, que estava sendo contratado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (FAPEU) para atuar no Projeto, precisava ir até o RU todos os dias apanhar cerca de 30 marmitas para os colaboradores envolvidos na obra.

Faltava dinheiro na conta do projeto 048 da FAPEU para compra de material e muitas vezes, para o pagamento dos pedreiros e serventes. A FAPEU foi sempre a nossa tábua de salvação, pois em nenhum momento as obras foram paralisadas ou reduzida a sua intensidade.

No final de 1984, quando veio o adiantamento do Banco Mundial, as coisas ficaram mais fáceis e o Laboratório pôde receber acabamento de primeira.  Em 1985, mesmo sem estarem concluídos todos os setores, o LCM iniciou suas operações.

Os primeiros 18 anos foram dedicados ao desenvolvimento da reprodução em cativeiro e ao cultivo em viveiros com as espécies nativas Farfantepenaeus paulensis e Litopenaeus shmitti. Os avanços no campo da reprodução das duas espécies foram definitivos, mas na engorda nas fazendas particulares, havia muitas limitações que não puderam ser  rompidas. As empresas tinham imensas dificuldades financeiras e incertezas que determinaram o fechamento de algumas.

A capacidade de produção de Pós larvas (PL) do LCM foi por alguns anos utilizada para os programas de repovoamento de lagoas costeiras, onde os estudos de recaptura eram realizados para medir a eficácia do sistema, que foi confirmada. Foram às evidências na debilidade das pós-larvas muito novas liberadas nos repovoamentos que induziram a equipe a estudar melhor a idade das Pós-larvas. Os estudos mostraram que entre os estágios de PL16 e PL18 as larvas já são capazes de se enterrar e são muito mais resistentes às flutuações ambientais como temperatura, salinidade e PH.  Então, passamos a desenvolver tecnologia de Pré berçários (de PL 5 ou PL10, até PL20).

O protocolo de produção de pós-larvas maiores modificou substancialmente a sobrevivências dos camarões nos viveiros de cultivo comercial. A sobrevivência era tão boa e estável que propiciou aos produtores a simplificação do processo produtivo, desativando os viveiros berçários de terra antes utilizados.

Em 1998, a situação financeira financeira das empresas que ainda operavam era muito precária. Foi então que, depois de vários meses de discussão, o grupo decidiu importar material genético (naúplios da espécie Litopenaeus vannamei) da Venezuela, cujo laboratório estava na 18ª geração sem nenhuma doença importante. Nesta época o trabalho conjunto no programa de repovoamento que era realizado com a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI) foi ampliado, tendo sido muito cuidadosa a assistência aos 03 produtores que realizariam os primeiros cultivos com o L. vannamei.

Os resultados não poderiam ser melhores. Altas taxas de sobrevivência, densidade de cultivo 3 vezes mais alta, conversão alimentar baixa, crescimento rápido e bom preço no mercado evidenciaram que uma nova fase para a indústria do cultivo estaria começando.

Foi então preparado o Programa Estadual para o Desenvolvimento do Cultivo de Camarões, que no Governo do então Governador Esperidião Amim, foi plenamente apoiado.

O Laboratório foi requerido para organizar junto com a EPAGRI todas as atividades de projetos, treinamento de pessoa, organização dos produtores, assistência técnica aos pequenos produtores, organização da produção e distribuição das pós-larvas.

A atividade do cultivo comercial, especialmente na região de Laguna cresceu de forma exponencial, de 30 hectares em 1998 para 1560 hectares em 2004.  O aumento da área de cultivo demandou do LCM produções cada vez maiores, o que implicou na necessidade de reengenharia das suas estruturas de bombeamento, aquecimento de água, salas modernas de larvicultura e pré-berçários, entre outras. Entre 2002 e 2003, o LCM apoiou a implantação de laboratórios de reprodução para a iniciativa privada.

Paralelamente, em fevereiro de 1999, a empresa Yakult S/A. Indústria e Comércio doou à UFSC uma área de 363 hectares, localizada na Região norte de Santa Catrina, mais precisamente no município de Baln. Barra do Sul, contendo 17 viveiros de solo que somam 23 hectares de lâmina de água.

A Fazenda Experimental Yakult, como é até agora chamada, recebeu apoio da Canadian International Development Agency (CIDA) para uma ampla reforma que incluiu sistemas de bombeamento, comportas, recuperação de edifícios e equipamentos.  Desta forma, a Fazenda foi direcionada para funcionar como Centro de Treinamento e para o desenvolvimento de pesquisas.

Os produtores de camarão de Santa Catarina tinham alta rentabilidade e os investimentos no setor eram cada vez maiores. Infelizmente, em 2004, foi notificado na região de Laguna o primeiro surto da “mancha branca”, uma enfermidade viral que já havia causado muitos prejuízos na indústria do cultivo em diferentes regiões do mundo.

Com o advento da enfermidade, as atividades do LCM sofreram forte impacto, especialmente por conta da sua interdição que até hoje não foi entendida.

Hoje, o Laboratório vem se reestruturando para dedicar-se mais a pesquisa, especialmente nos temas relacionados à substituição do modelo tradicional de produção que á mais propício para a manifestação da doença da mancha branca.

Com a boa infraestrutura que dispõe, o LCM vem ampliando as suas áreas de atuação, especialmente com a inclusão dos Laboratórios de Microalgas, de Macroalgas e de Oceanografia Costeira do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (LOC), que há vários anos está integrado ao LCM.

Também, áreas novas de pesquisa como o cultivo convencional ou aquapônico da Sarcocornia ambigua,  “erva sal” melhoram as perspectivas de desenvolvimento do setor.

Uma vez que o LCM deixou de produzir pós-larvas de camarão visando o abastecimento das fazendas de cultivo, os espaços tem sido utilizados pelos estudantes de graduação e de pós-graduação para o desenvolvimento das suas pesquisas para Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC), trabalhos de mestrado e de doutorado, o que amplia bastante o nível de publicações dos envolvidos com o Laboratório.